31.10.09

This Is It

Eu não chorei. Aquele aperto no peito é mais pesado que o choro. Tinha tudo pra ter um final feliz. É o lembrar tudo que poderia ter sido e que não foi.
O ponto maravilhoso desse documentário é a falta de detalhes pessoais: o diretor tinha como pretensão mostrar, sempre mostrar sem contar, todo o trabalho artístico da turnê e, claro, do próprio Michael. Quem procurou assistir ao filme para ver polêmica e fofocas perdeu tempo e dinheiro. Finalmente alguém conseguiu mostrar o quanto MJ era maior que todos os escândalos, maior que a opinião pública. Era, definitivamente, um músico, um bailarino. Um artista. Sabia exatamente o que estava fazendo. Em termos artísticos, claro.


23.10.09

Do conformismo do homem na sociedade de consumo frankfurtiana ou Viva la Revolución

De sorrir por dentro
iluminam-se os céus;
De chorar por dentro
iluminam-se os céus.

Porquanto o respirar atrai outro respirar
e neste o pensamento em nada influi.
Mas do respirar do pensamento,
do chorar e do sorrir,
iluminam-se os céus
ou devora-os a penumbra em trevas.

22.10.09

Er...

Ok, não tenho o que comentar. Ou é demais para a minha capacidade cognitiva, ou coerência não é o ponto forte desse blog.
via: http://tedouumdado.com.br

13.10.09

Liberdade de andar de bermuda por aí.

Às vezes eu acho que o machismo é tão grande e controlador que até o feminismo, o feminino e o femismo se submetem ao poder gramatical e social do masculino.

8.10.09

Continuidade dos Parques

Começara a ler o romance dias antes. Abandonou-o por negócios urgentes, voltou à leitura quando regressava de trem à fazenda; deixava-se interessar lentamente pela trama, pelo desenho dos personagens. Nessa tarde, depois de escrever uma carta a seu procurador e discutir com o capataz uma questão de parceria, voltou ao livro na tranqüilidade do escritório que dava para o parque de carvalhos. Recostado em sua poltrona favorita, de costas para a porta que o teria incomodado como uma irritante possibilidade de intromissões, deixou que sua mão esquerda acariciasse , de quando em quando, o veludo verde e se pôs a ler os últimos capítulos. Sua memória retinha sem esforço os nomes e as imagens dos protagonistas; a fantasia novelesca absorveu-o quase em seguida. Gozava do prazer meio perverso de se afastar, linha a linha, daquilo que o rodeava, a sentir ao mesmo tempo que sua cabeça descansava comodamente no veludo do alto respaldo, que os cigarros continuavam ao alcance da mão, que além dos janelões dançava o ar do entardecer sob os carvalhos. Palavra por palavra, absorvido pela trágica desunião dos heróis, deixando-se levar pelas imagens que se formavam e adquiriam cor e movimento, foi testemunha do último encontro na cabana do mato. Primeiro entrava a mulher, receosa; agora chegava o amante, a cara ferida pelo chicotaço de um galho. Ela estancava admiravelmente o sangue com seus beijos, mas ele recusava as carícias, não viera para repetir as cerimônias de uma paixão secreta, protegida por um mundo de folhas secas e caminhos furtivos, o punhal ficava morno junto a seu peito, e debaixo batia a liberdade escondida. Um diálogo envolvente corria pelas páginas como um riacho de serpentes, e sentia-se que tudo estava decidido desde o começo. Mesmo essas carícias que envolviam o corpo do amante, como que desejando retê-lo e dissuadi-lo, desenhavam desagradavelmente a figura de outro corpo que era necessário destruir. Nada fora esquecido: impedimentos, azares, possíveis erros. A partir dessa hora, cada instante tinha seu emprego minuciosamente atribuído. O reexame cruel mal se interrompia para que a mão de um acariciasse a face do outro. Começava a anoitecer.

Já sem olhar, ligados firmemente á tarefa que os aguardava, separaram-se na porta da cabana. Ela devia continuar pelo caminho que ia ao Norte. Do caminho oposto, ele se voltou um instante para vê-la correr com o cabelo solto. Correu por sua vez, esquivando-se de árvores e cercas, até distinguir na rósea bruma do crepúsculo a alameda que o levaria à casa. Os cachorros não deviam latir e não latiram. O capataz não estaria àquela hora, e não estava. Pelo sangue galopando em seus ouvidos chegavam-lhe as palavras da mulher: primeiro uma sala azul, depois uma varanda, uma escadaria atapetada. No alto, duas portas. Ninguém no primeiro quarto, ninguém no segundo. A porta do salão, e então o punhal na mão, a luz dos janelões, o alto respaldo de uma poltrona de veludo verde, a cabeça do homem na poltrona lendo um romance.

CORTAZAR, Julio. Final do jogo.
Trad. Remy Gorja Filho.
Rio de Janeiro, Ed. Expressão e Cultura, 1971.

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(Não, eu ainda não consegui superar...)