14.12.10

O Inferno I

O inferno vai ser cheio de unhas com esmalte azul cobalto e nosso trabalho vai ser tirá-lo com removedor de esmalte vagabundo por toda a eternidade. E sem manchar.



(da série "Minha ideia de inferno")

26.3.10

All the single planets

Fazia tempo que não via algo tão genial, com esse capacidade intertextual com a cultura pop. (?)



Para ver ouvindo: Single Ladies

29.1.10

I'll take a ride on the wild side

Foram sete lagartixas, um jacaré empalhado; três noites, quatro dias; três banhos; muitas comidas.
Foram dois gagaísmos, uns cinco emos. E dois meses sem sair de casa: "Pra aprender a não beijar emo, menina!"

Agora são uma hora e meia de rodoviária, duas e meia de rodovia e o infinito em viagem. Ao infinito e além! Até que a água nos pare por terra e por ar, e o ônibus se recuse a persistir. Até que o motor se afogue ou se fechem as janelas, ignorantes ao externo e concentrante da situação miserável e confortável do interior. Parabéns pelo novo ar-condicionado! Parabéns pela nova casa alta! Mas cuidado. O homem também falha. Até o mais profissional.

16.1.10

"Sherlock Holmes", eu e minha avó.

Eu assisti a esse filme ontem e curti muito. É um de potencial blockbuster com um toque cult. Não tem muito do rigor dos livros do Sir Conan Doyle. Bom, o próprio diretor, nosso velho conhecido Guy Ritchie, admitiu não ter lido um livro do detetive sequer. No filme, Sherlock Holmes é condecorado com mais alguns papéis, além de detetive com a percepção aguçada presente na memória coletiva: homem apaixonado e, em certas cenas, humorista. Além de um grande lutador. A aposta foi em sociedades secretas e magia negra, assuntos medievais bem em voga atualmente.

Muita ação, tiros e mortes nos lembram a cada segundo do diretor (que, né, quando deixou isso de lado, flopou homericamente em "Swept Away"), mistérios e o raciocínio lógico nos lembram do Sherlock Holmes que conhecemos nos livros de Arthur Conan Doyle ou simplesmente conhecemos por ser uma figura que se inseriu tão fortemente na nossa cultura.

ahazou, Guy

4.1.10

Assassinando Cecília

Eu canto porque o silêncio persiste
e minha vida se completa
sou alegre e sou triste,
não poeta.

16.12.09

Porque seu pai...

"Meu pai"? Até onde eu sei, não escolhi qual espermatozóide carregaria metade de mim. Não escolhi nem pai, nem mãe. Colocar "seu pai" numa conversa não é a melhor maneira de falar sobre qualquer coisa. Tudo não pode convergir para o assunto "seu pai".
Não jogue nas minhas costas a responsabilidade por cada molécula de ar que ele respira. Mais uma vez: eu não escolhi meu pai. Não tenho culpa pelo que ele faz (ou não faz, melhor).
Eu não escolhi o seu marido também.
Não sou eu que errei uma vez e pretendo errar tantas outras vezes possíveis.
Posso ter escolhido tantas outras coisas certas e erradas. Mas não escolhi meu pai. Sem que haja qualquer valor afetivo em "pai" aqui escrito.

10.12.09

Cada qual com sua Quimera

Sob um grande céu cinzento, numa grande planície poeirenta, sem caminhos, sem gramados, sem uma urtiga, encontrei vários homens que andavam curvados.

Cada um deles carregava nas costas uma enorme Quimera1, tão pesada quanto um saco de farinha ou de carvão, ou os apetrechos de um soldado da infantaria romana.

Mas a monstruosa besta não era um peso inerte; pelo contrário, envolvia e oprimia o homem com seus músculos elásticos e possantes; grampeava-se com suas duas vastas garras no peito de sua montaria; e sua cabeça fabulosa sobressaía acima da fronte do homem, como um daqueles capacetes horríveis com os quais os antigos guerreiros esperavam acirrar o terror inimigo.

Interroguei um desses homens, e perguntei-lhe aonde iam assim. Respondeu-me que de nada sabia, nem ele, nem os outros, mas que evidentemente iam a algum lugar, já que eram levados por uma invencível necessidade de andar.

Coisa curiosa de se notar: nenhum dos viajantes parecia irritado com a besta feroz pendurada em seu pescoço e colada em suas costas; dir-se-ia que a considerava como fazendo parte de si mesmo. Todos esses rostos cansados e sérios não demonstravam desespero; sob o céu, com os pés mergulhados na poeira de um solo tão desolado quanto este céu, eles caminhavam com fisionomia resignada daqueles que estão condenados a ter sempre esperança.

E o cortejo passou a meu lado e afundou na atmosfera do horizonte, no lugar em que a superfície arredondada do planeta se esquiva à curiosidade do olhar humano.

E, durante alguns instantes, teimei em querer compreender esse mistério; mas em seguida a irresistível indiferença se abateu sobre mim, e me deixou mais duramente oprimido do que eles próprios por suas esmagadoras Quimeras.

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BAUDELAIRE, Charles. "Cada qual com sua Quimera" in: Pequenos Poemas em Prosa (O Spleen de Paris). São Paulo: Hedra, 2009. p. 47

27.11.09

XIX

Se eu soubesse
Teu nome verdadeiro

Te tomaria
Úmida, tênue

E então descansarias.

Se sussurrares
Teu nome secreto
Nos meus caminhos
Entre a vida e o sono

Te prometo, morte,
A vida de um poeta. A minha:
Palavras vivas, fogo, fonte.

Se me tocares,
Amantíssima, branda
Como fui tocada pelos homens

Ao invés de Morte
Te chamo Poesia
Fogo, Fonte, Palavra viva
Sorte.

(Hilda Hilst. Da morte. Odes mínimas.)

12.11.09

Descrição

"É a sazão outonal, em meio ao carnaval da efêmera duração. Inflama-se o rubor das rosas, a tez de sangue vivo das flores adquire maravilhosa cintilação tísica."

A fome, Knut Hamsun. Trad: Carlos Drummond de Andrade.