13.12.08

Boneca fechada

"Já se dizia no meu
tempo: todo bandiguei
que se preze tem seu
gaydacu furolho."

"Se joga, pintosa.
Põe rosa!"
(Lema Drag)

Num tempo em que Cher ainda tinha cabelo, a buatchy Moon Spaikle era lotada de estrelas. Sheila-Shoulder, o strass Swarowiski da casa, tinha clientes fixos que a presenteavam com toda sorte de brilhos.

A mona era tudo o que uma trava queria ser: suas unhas de silicone-gel eram um escândalo-bee!-garras-de-pavão; as madeixas castanho-dourado-balaiage-surf-hair recebiam escovas hidratantes de manteiga de karité, chocolate e morango semanalmente; tinha olhos verde-esmeralda, herança dinamarquesa da avó, realçados pelos cílios postiços compridéééérrimos.

Helly Colêra amava aquela gata malhada. Conheceram-se quando Sheylinha era Robson e não passava de uma bichinha-pão-com-ovo. Colêra era um gatão meia-idade, bombadão e depilado, barbie oleosa das baladas GLBT, dançava furiosamente com seus flags ti-di. E tudo destacado pela reluzente corrente-coleira, origem da alcunha.

Porém a felicidade desse colorido casal de Malhação versão purpurina era perturbada pela despeita de uma beesha invejosa: a malévola Janete Poquete - "'Boquete'? Não, 'Porquete'!"

Janete Poquete era traíra: queria todo aquele brilho da boneca mais famosa, nada menos que isso. A exu-berância das curvas barbie-fairy-thopia inundavam os olhos da rival de cobiça. A mona invejosa praguejava, achava que era um puta-mundo-injusto-meu!: a outra tinha "money, fame, glam success", enquanto ela era uma gata borralheira naquela casa de drag.

Mas Janete não era passiva-uepa! - corria atrás do prejuízo - era uma quase-mulher guerreira. Numa tarde, jogada em seu divã rosa, usando o baby-doll comido pelas traças e calçando meias frouxas, ideiou um diabolicismo que poria fim naquele martírio: uma cartomante despacharia um trabalhinho contra aquela barbie-falsa, coisinha pouco. Levantou, deu um tapa na maquilagem e foi procurar uma colega de longa data que daria um jeito nesse puta-mundo-injusto-meu!

Nos confins de Guaianazes, Mãe Abigail, poderosíssima baiana, fazia de tudo: desde quiromancia, passando por leitura de runas, borra de café, tarot de Marselha, búzios, até manicure e pedicure.

Janete estava disposta a fazer daquele despacho um investimento, investimento num fundo (e que fundo!) de renda fixa, investindo para colher os juros depois.

O trabalho faz o cabelo da mocréia cair todo. Bibi disse ser da boa. Só umas mechas do cabelo e o scarpin do figurino.

Do cabelo não se tinha. Janete Poquete apoderou-se dos restos da depilação íntima de Sheyla. O trabalho fica até mais forte assim. Farofa de crista de galo regada a óleo de dendê socada dentro do sapato. Despacho feito, afastou-se rindo o riso mais maligno.

Sheylinha boneca, entretanto, fechava o corpo todo dia. Clientes feiticeiros abriam-lhe a alma e lhe fechavam o corpo. Mas nunca que trabalho do tipo pegava na bee!

O duelo foi frente-a-frente; muitas unhas e cabelos, chutes, pontapés, purpurina e estampa de oncinha. Porquete - "'Boquete'? Não, 'Poquete'!" - sagaz tirou da bag-Louis-Vitton-Vinte-e-Cinco o outro sapato do par-de-show. Cravou o salto do pescoço de Sheyla Shoulder, aqui, onde a carne é mais macia; um jato de sangue escapou-lhe a 50 joules numa inclinação de 63,5 graus. O sangue reluzia prata brilhoso-carnavalesco. Minha avó já me dizia: "Silêncio é morte de puta.". O mundo se calou. E se brilhou em purpurina.

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Trabalho pra Carla. Supostamente um conto Guimarães-Rosa-Style. Dinha, Aline, Damaris e eu.
(Nunca duvide da criatividade da Damaris. E da minha veia trágica.)

Um comentário:

Unknown disse...

o pontapé da putaria foi meu ok rs

Dinha